A beleza da ingenuidade

Por Camila Heloíse

Outro dia, minha sobrinha que mora no interior, me mandou um áudio perguntando “tia, aí neva?”. Moro a uns 470 km de distância, próximo a São Paulo. Eu ri. Ela me pergunta coisas engraçadas no telefone como se eu morasse em outro planeta. Já me perguntou se a comida por aqui era “normal”, e da última vez, me perguntou se eu tinha vizinhos no prédio e se eu era amiga deles. Pensei sobre o fato de eu ter 38 famílias como vizinhas, só conversar com uma delas e nem se quer saber o nome das pessoas que eu conheço.

Também dou bom dia para um guarda que mora no prédio. Ele me chama pelo nome, eu nem sei o nome dele também. Mas eu disse simplesmente a ela que sim, e ela respondeu sorridente “melhor né tia, assim você não se sente tão sozinha”.

Conheço apenas três Estados. Mas, pra ela, eu já viajei o mundo inteiro e ela diz “você deve ser super feliz com esse tanto de viagens pelo mundo, né tia?”. Talvez eu não saiba o quanto sou feliz, meu amor.

Essas perguntas simples me fizeram refletir, com cada fagulha de criatividade que eu tive que usar para responder, sem destruir a beleza da sua ingenuidade.

Ela viu a foto do mar, que eu mostrei pelo celular, e perguntou se era permitido entrar na água, e questionou quem era o dono do mar, se “ele” deixava. Não disse que o mar era de ninguém, expliquei que o dono era Deus, e que nós, tínhamos a obrigação de cuidar bem das praias, e que era legal pedir licença para entrar no mar, já que ele tem uma personalidade muito forte. Expliquei que deveríamos respeitá-lo.

Ela já me perguntou se eu queria ser mãe, e disse que parece ser legal ter um nenê para amar. Que ter filho era fácil, bastava só amar e dar comida pra ele (rs).

Quando me sinto triste, ligo pra ela. Ela sabe. Alguma coisa dentro dela sabe o quanto eu preciso desse amor desmedido e simples. Aquele pequeno grande coração sabe que a vida é doce, nós, os adultos, é que esquecemos – e endurecemos com o tempo.

Da última vez que a visitei, eu levei vários presentinhos. Me preocupei em escolher as coisas da cor que ela gosta, e tudo com detalhes em glitter ou unicórnio. Mas, ela se lembrou do cubinho de queijo que eu dividi com ela, uma caixinha de polenguinho que levei pra comer durante a viagem. O momento em que sentamos pra ver um filme de princesa e eu dividi o queijo com ela, foi mais marcante do que todos os presentes que eu não pude dividir ou aproveitar junto dela.

São lições diárias recheadas de amor e afeto. E eu, já tive tantas dúvidas sobre se aprendemos pelo amor ou somente pela dor. Por muito tempo acreditei que a vida era dura mesmo e que o resto era apenas ilusão e que não valia a pena. Mas, um amor desses, tomba a gente pela raiz. Um amor desses faz a gente capotar nas curvas que a gente usa pra fingir racionalidade e evitar a parte maravilhosa da vida.

Eu quero é mais que coisas assim, tão ingênuas quanto as perguntas dela, me afoguem em carinho. Quero aprender com ela a não me esquecer de que preciso conversar mais e atentamente com meus vizinhos, que preciso aproveitar melhor as minhas viagens, ainda que sejam pra perto, e que os melhores presentes que posso levar não estão nas lojas mais bonitas.

Quero – principalmente – não deixar morrer esse laço feito de fita infinita que enlaça as pessoas que se amam. E descobrir um jeito de proteger, naquele mundo pequeno e cor-de-rosa, a beleza da sua ingenuidade.

Daqui de cima o mundo é seco, meu amor. Mas, se depender de mim, você só subirá nessa montanha para admirar o céu e as estrelas.

 

*É permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte.

A riqueza da humanidade

Por Camila Heloíse

Os tempos são difíceis, sabemos. Todos os dias os jornais nos entregam números assustadores e índices de mortes, roubos, doenças, pobreza e dor que não param de aumentar. Estamos tão acostumados a pautar o nosso dia com essas informações, que já não olhamos o quão boa a vida também sabe ser.

Nesse mesmo dia, em que pessoas se mataram, outras venceram uma importante luta pela vida. Alguns bebês nasceram, pessoas se casaram, ONG’s cumpriram seu importante papel na sociedade e ajudaram outras tantas. Árvores foram plantadas, flores foram regadas e animais resgatados e cuidados. Isso significa que não acontecem apenas coisas ruins, e que as coisas boas, com toda certeza, são infinitamente maiores, embora não tão noticiadas. Se não fossem, acredito que já não existiríamos mais.

Porém, existimos. E somos fortes, capazes e superamos a dor, a perda, a tristeza e a solidão. Quando nos recordamos da nossa infinita capacidade de amar, e de refletir sobre o mundo e as pessoas, sem que isso nos amargure, voltamos à vida. Ao recordarmos de que todas as coisas e pessoas estão só de passagem, damos novo sentido aos relacionamentos interpessoais e perdemos o medo da falta, da solidão, identificando o apego e podendo assim, buscar uma maneira mais leve de encarar o cotidiano.

Haverá derrotas, infinitas! Tantas que você desistirá de vários sonhos pelo caminho. Mas também vão existir vitórias infindáveis, onde a sua determinação se multiplicará, sua força se dobrará e a vida parecerá algo muito melhor do que é. Com isso, novos sonhos surgirão cada vez maiores e com a certeza de sua realização.

Viver é sobre isso: não olhar apenas os fracassos da humanidade, mas sim, suas riquezas.

Somos parte de um mundo onde as pessoas são capazes de dividir o pouco que tem para que outros sobrevivam. Cuidamos uns dos outros, temos esperança e fé na vida, somos criativos, ousados e resistentes. Não somos apenas parte de um triste índice repetido nos telejornais. Somos além.

Então, como sobreviver e um mundo que nos parece mais triste do que feliz?

Seguindo em frente! Colocando o amor antes de cada passo, de cada ato. Escolhendo fazer parte do índice onde o bem só aumenta e sempre vence o mal. Segurando firme nas mãos de quem tem capacidade de enxergar a beleza da vida, de quem tem a paciência de esperar cada semente gerar seu fruto.

Viva, para além das expectativas divulgadas. O medo ocupa muito espaço em nossos corações e mentes, então, deixe-se guiar pela esperança até que isso se torne um hábito. Construa um norte para seguir que te permita observar e vivenciar a riqueza da humanidade, este lugar onde existe paz, amor e coragem.